Cores fortes, traços de giz e sentimentos: a vida e a arte de Luiza Azambuja
Por Isadora Pimenta
Cores, expressões, calmaria e natureza. Essa é a essência de Luiza Azambuja. Segurando os cachorros e jogando os cachos para trás, é assim que a artista plástica conhecida como ArtsMaza nos recebe em seu atelier para conversarmos sobre o que mais queríamos saber: quem é essa menina por trás das manchas de giz pastel?
Luiza é o tipo de pessoa que inspira e expira arte. A forma de se vestir, os cachorros companheiros, o tapete de crochê no chão de cimento queimado. Tudo ali compõe a ideia inicial que se tem quando se conhece Luiza: “com certeza ela mexe com arte”.
Em seu atelier, tentamos reconstruir passos e reviver lembranças para conhecer a vida e a arte de ArtsMaza, eternamente entrelaçada com a alma de Luiza.
A infância
Para entender melhor a artista que vemos hoje nas ruas e nas redes sociais, precisamos voltar para onde tudo começou: dentro de casa.
Muitos artistas batalham com a falta de exemplos. Você sente aquele fogo interior de criar, mas ao seu redor vê apenas adultos que vão ao trabalho de manhã e voltam à noite. Para Luiza, não foi bem assim.
“Eu fui criada de uma maneira um pouco diferente. Minha mãe teve um trabalho convencional de sair pra trabalhar todos os dias e voltar à noite. Enquanto meu pai foi autônomo a vida inteira. Então ele que me criou, cuidou de mim. E eu vi ele tendo essa rotina flexível e diferente”.
A importância dessa influência dentro de casa é facilmente perceptível no brilho nos olhos da artista ao falar do pai. Músico, designer, marketeiro e fotógrafo, Paulo Laranja mostrou em forma de exemplo o que era viver da arte, de uma maneira tão intensa que parecia não haver outra opção senão criar.


Criança inquieta - artista completa
Manifestada de diferentes maneiras, a arte sempre esteve com Luiza. Quando criança, preferia sempre as brincadeiras mais mirabolantes, gostava de teatro e brincava com toda e qualquer forma de criar, seja tinta, biscuit ou desenho.
“Sempre fui aquela criança que não conseguia parar quieta um segundo. De inventar moda... Nossa, as brincadeiras eram as mais loucas possíveis. Sempre gostei de desenhar, de fazer biscuit, de pintar coisinhas para vender. Sempre gostei do teatro na época da escola, não era uma coisa que eu seguia, mas era algo que eu gostava muito.”
Pandemia e autoconhecimento
A arte sempre esteve lá, espreitando, esperando o momento certo de dar as caras e fisgar essa menina para sempre. E na pandemia, ela viu uma oportunidade imperdível. Em meio a tantos caos e incertezas, para Luiza, a pandemia abriu portas para o autoconhecimento.
Foi neste período que ArtsMaza nasceu (ou renasceu). Presa em seu quarto, Luiza se viu instigada por uma velha caixa de gizes pasteis em seu armário e decidiu usar o tempo extra para se dedicar e explorar este material.
“Foi justamente nesse período que eu comecei a sentar para desenhar e produzir com mais frequência. E acredito que todo mundo consegue desenhar, é só estudar e treinar. Então, eu tive muito tempo para treinar, que era uma coisa que eu já gostava, mas que eu não tinha habilidade. É até engraçado ver as coisas de 2019 e as coisas do meio da pandemia, foi um salto grande.”
Dessa forma começa o relacionamento mais forte e duradouro da vida de um artista: aquele com seu material. Neste casamento, hoje mais forte do que nunca, houve um casamenteiro. Luiza conta que começou a produzir obras em pasteis inspirada pelo artista americano Black Bean que abriu seus olhos sobre as possibilidades do material.
“Na pandemia, nessa história minha de voltar a desenhar e tudo mais, eu estava assistindo muitos vídeos do Black Bean, que é um americano. E ele trabalha principalmente com giz pastel oleoso. Eu gostei muito do conteúdo dele. Então, ele me inspirou a tirar aquela caixinha de 12 cores do armário e dar uma brincada. Então, fui desvendando aquele material. No início era ridiculamente igual às obras dele. Tentava replicar muito. Ele brinca com essas coisas das cores. Mas com o tempo eu fui adquirindo minha técnica e desvinculando um pouco das obras do Christian.”
Com o passar dos anos, ArtsMaza foi criando sua identidade. Apesar de já ter explorado outros materiais e fazer estudos fora de sua zona de conforto, ela mesma se considera a “menina do giz pastel oleoso” e não vê este casamento terminando em nenhum momento próximo.
Suas obras trazem o ardor do corpo humano por meio de cores vibrantes em camadas, explorando figuras humanas diversas e brincando com os formatos para criar algo forte e marcante.
Artista plástica com faculdade de design?
Antes deste período de mudanças que impactou toda a humanidade, Luiza tinha entrado para a faculdade de design, inspirada pelo trabalho e dia a dia de seu pai e pelos vídeos da influenciadora Fernanda Domingos (femingos). Em meio aos avanços de sua arte, surgiu o pensamento óbvio: e agora? Seria o momento de mudar de curso?
Para a artista, a resposta foi não. Não sairia do design. A jogada de mestre de ArtsMaza foi perceber que para ela, a faculdade de design só viria a agregar, dando outras perspectivas para sua produção artística e contribuindo para que ela pudesse transformar sua paixão em negócio.
“Como a coisa se desenvolveu ao longo da pandemia relacionada à arte, eu pensei em largar a faculdade várias vezes. Talvez fazer uma belas artes, algo assim. Mas eu continuei, eu vi que mesmo se não fosse para trabalhar dentro de um escritório, o curso de design iria ser importante nesse todo desse processo como artista ou como autônomo. Desde a parte da comunicação, do marketing ou da parte visual e estética que o design tem. Acho que foi um grande aprendizado, assim, para eu, como artista, saber e ter aprendido isso tudo.”
Mas como todo artista que decide seguir a arte como profissão, a mudança de foco fez com que agora suas obras não fossem mais apenas hobbies, e sim produtos. Apesar de ainda não conseguir se manter apenas com seus quadros, Luiza já sente a pressão de monetizar sua paixão.
“Hoje em dia, infelizmente, ainda não consigo viver só da arte. Então, eu tenho minha rotina flexível aqui no ateliê, mas eu tenho clientes de design, faço alguns freelas. Algo para eu conseguir ter um dinheiro fixo, uma segurança ali no fim do mês, mas continuar tendo a minha rotina de produzir minhas coisas e correr atrás desse sonho de viver de arte. Mas a coisa de monetizar o hobby, é bem forte. Isso é uma coisa que eu notei muito, a pressão de ter que vender, ter que produzir conteúdo e (da arte) parar de ser tão legal igual era antes de tudo virar um trabalho.”
Como é de se esperar, para a artista, fazer uma arte encomendada, por mais que seja uma conquista e uma ótima forma de ganhar a vida, coloca um limite no céu, algo que não existe quando se produz uma obra livre.
Felizmente, sua alma artista lhe permite explorar todas as vertentes da arte e se divertir, sabendo que nem todas elas são voltadas para o lucro. Ao falar da música e do canto, Luiza relembra essa importância de fazer coisas só para se divertir, sem pensar em ganhar dinheiro.
“No caso da música foi um pouco diferente. Faz parte dos hobbies que não são monetizados. Inclusive, teve um período que ele começou a ser monetizado e eu pirei total. Falei, não, eu não posso ter mais um hobby monetizado. Então, acho que é interessante eu não monetizar tudo.”
Aos poucos, a artista aprende a navegar entre trabalho, vida e lazer, construindo sua marca, uma conquista de cada vez. Um grande marco de sua profissão aconteceu em 2025, com a abertura de seu atelier.
O atelier e a vida de artista
Quem já foi estudante ou profissional autônomo e teve de trabalhar em seu quarto sabe o estresse de nunca desligar. Para Luiza não foi diferente. Rapidamente seu quarto se tornou pequeno demais para dividir com todos seus gizes, folhas, cores e personagens. Por sorte, logo quando a marca ArtsMaza estava tendo suas primeiras vitórias, um pequeno espaço, antes usado como kitnet, vagou no condomínio onde morava. Assim surgiu o atelier.
“Novembro que eu comecei as coisas aqui do ateliê. Já passaram alguns meses. Mas foi muito do nada. E bem nessa fase antes de eu conseguir o ateliê, eu tava passando por muitas questões, tendo que pintar no meu quarto. Era uma coisa meio... Não conseguia desvincular meu trabalho da minha rotina. Então eu dormia olhando pro papel gigante na parede do meu quarto, sabe? E não consegui parar de trabalhar e descansar. Tudo era no mesmo ambiente.
Então fez uma grande diferença eu ter esse espaço. Além de ser um espaço amplo, eu consegui receber outros artistas e produzir, posso deixar a bagunça aqui, trancar a porta e ir pra casa. Acho que foi muito importante pra minha rotina mesmo. Porque foi bem tipo... Terminei a faculdade, vou ser autônoma e ter um espaço para desfrutar disso. Foi muito importante.”









Trabalhando como autônoma e produzindo arte, muitas vezes Luiza teve de lutar contra as dificuldades que vem de não ter um trabalho tradicional. Work life balance e todas essas coisas que a maioria de nós jovens ainda não sabe navegar. Mas para ela, ter seu espaço foi essencial.
“É você por você. Só você com você. Se você quiser passar o dia assistindo série, é você que vai sofrer no final. E realmente ainda não tenho a senha do negócio, mas é algo que eu constantemente tento me policiar e organizar essa rotina. E a coisa do ateliê ajudou muito nisso, de eu ter um horário de vir e um horário de sair e tentar cumprir essas oito horas. Mas claro, tendo um horário flexível, quando tem dia que não vai dar, eu não preciso morrer por isso, sabe? Eu acredito que dá para ir organizando. Mas realmente, acho que tem que ter muita disciplina.”
O bloqueio criativo infelizmente chega para todos, mas Luiza aprendeu a lidar com essas fases usando de artimanha as multifacetas de seu trabalho. Designer, artista e produtora de conteúdo, nem sempre você vai encontrá-la com o giz na mão.
“Não é 100% do tempo que eu estou pintando e me sujando inteira de giz. Grande parte do processo está em ficar na frente do computador, resolver coisas chatas. Mas tem dia que nem isso. Eu entendo que vai ter dia que eu não vou vir. Sei lá, vai ser uma terça-feira e eu vou dar um rolê na cidade, buscar inspiração em outras coisas e tentar ficar bem com isso. Não tentar achar que eu estou vagabundando e burlando o trabalho. Porque eu acho que na parte criativa, isso é importante. Mas eu acho que tem muito essa mudança de ares, em um momento eu estou pintando, fazendo um projeto, no outro eu estou editando um vídeo, no outro eu estou fazendo coisas para o site. Acho que não é tão monótono.”
Já com um espaço de trabalho e um produto bem estabelecido, a artista entendeu que precisava pensar em sua arte também como negócio e isso significava desenvolver outros setores de sua empresa como marketing e gestão empresarial.
A produção de conteúdo e o audiovisual sempre foram paixões de Luiza, então o fortalecimento de suas redes foi um projeto que veio como algo natural. Gravar seus processos se tornou algo constante, mesmo que sem um roteiro ou vídeo premeditado.
“Eu sempre tento gravar o que eu estou produzindo, se for um quadro ou uma coisa, mas não já pensando no pós, o pós eu decido depois com aquilo que está gravado. Porque eu acho que já é trampo demais eu ter que prestar atenção na gravação enquanto produzo. Eu gosto da parte do audiovisual, mas é chato essa pressão de ter que gravar literalmente tudo que eu for fazer.”
Agora quando o assunto é gestão, Luiza foi buscar o conhecimento que ela não tinha.
“Recentemente eu dei uma estudada (...) em gerenciamento de negócio e gestão financeira de pequenas empresas, porque me deu um start de tipo, se eu quero viver disso de forma autônoma, seria interessante entender como funciona esse rolê. E abriu bastante minha cabeça, até para direcionar o que divulgar, o que vender, metas para conseguir que as ArtsMaza sobreviva e consiga pagar a pessoa física do Luiza Azambuja, todo esse rolê, sabe? Então foi uma virada de chave recente, então eu estou nesse processo.”
Criando entre velhos e novos amigos
Além de produzir em seu atelier, Luiza leva seus gizes para passear e com eles alguns amigos. Foi assim, nesta onda de querer produzir em lugares inusitados que surgiu o Produzindo por Beagá.
“Eu e outros três amigos que gostam de desenhar, a gente marcou despretensiosamente um rolê de desenho. E eu com essa coisa de querer criar conteúdo em cima de qualquer coisa, eu fiz um vídeo desse dia. A gente foi no CCDB desenhar. E eu gravei essa coisa e o nome que veio na cabeça para chamar de vídeo foi Produzindo por Beagá. Mas no início não tinha uma ideia ou uma coisa futura em mente.
Foi postando esse vídeo que eu vi que muita gente se interessou, a galera falando ‘nossa, chama a gente para a próxima’. E aí rolou uma próxima, e rolou uma próxima, de início só no meu Instagram. Mas a gente viu que a coisa tinha potencial de realmente chamar mais pessoas que estão interessadas nesse mesmo rolê e de conhecer essa galera. Então a gente abriu essa comunidade, nós quatro, como administradores. E hoje em dia a gente tem o Instagram, tem o grupo do WhatsApp, que já tem mais de 60 pessoas. Realmente acho que é legal conhecer essa galera que têm os mesmos gostos, no sentido de desenhar por aí.”
O projeto, que começou do nada, já teve 6 edições e continua crescendo a cada encontro.
O que esperar de Luiza Azambuja?
Felizmente, o ano de 2025 promete e ArtsMaza ainda vai colocar muito giz sobre papel.
“A ideia é continuar produzindo conteúdo, tentando fazer com que o nome cresça e gerar uma comunidade que me acompanhe, de clientes e compradores.”
De dentro do seu atelier, podemos esperar novas coleções e obras temáticas. Inclusive, o Malagueta já recebeu spoilers de uma nova coleção de jazz que está no forno.
Também podemos esperar ver a artista em exposições e eventos por BH. Apoiada sempre pelos curadores Marcos Esteves e Paulo Apgáua, ArtsMaza já é presença confirmada em alguns eventos na capital, como o evento de abertura dos 10 anos da Modernos Eternos.
“Eu participei da Modernos Eternos do ano passado. Foi bem legal, fiz uma pintura ao vivo. Eu e outros 14 artistas, foi uma galerona fazendo pintura ao vivo na noite de abertura. E aí esse ano a Modernos faz 10 anos e estarei no evento novamente.”
Além da exposição de pintura ao vivo, a artista também contou sobre um novo formato de Art Battle que está chegando em BH, no qual os artistas criam obras no meio do bar, cheio de gente.
“Mas é isso, são coisas que eu sei que vão acontecer já, mas tô animada pra esse ano. Acho que ainda vem bastante coisa legal por aí,” compartilhou a artista.
E foi assim, entre risos e o barulho do golden retriever Bruce Wayne mordendo sua bolinha, que mergulhamos no oceano de águas calmas que é Luiza Azambuja. Espero que vocês também tenham sentido o gostinho salgado da água na ponta da língua.
Incrível demais essa história